Cidade-fortaleza de Fasil Ghebbi, Gondar, Etiópia
Oito horas da manhã do meu primeiro dia de viagem à Etiópia. Aterro em Gondar. Saí há mais de 24 horas do Porto com destino a Barcelona, de onde um voo da Egyptair com uma prolongada escala nocturna na cidade do Cairo me trouxe até Addis Abeba onde cheguei a meio da noite. Pela manhã apanhei o primeiro voo interno da Ethiopian com destino a Gondar.
Fui para a Etiópia sem planos definidos. Tinha alguns locais onde queria ir, mas não sabia por onde ia começar. A razão de voar ao invés de viajar por terra é simples: chegar a Gondar de autocarro levaria no mínimo um dia e meio e eu só tinha 10 dias para conhecer o máximo possível da Etiópia.
Dormi quase toda a viagem. À chegada ao aeroporto, que ainda fica a alguns quilómetros da cidade, deparei-me com alguns homens na sala das chegadas a oferecerem transporte para os hotéis que representam. Tentei falar com o de um dos hotéis que já tinha visto ser a preço acessível e minimamente bem localizado, explicando-lhe que não tinha reserva. Ele não falava ponta de inglês, mas lá fomos.
Tinha assim o meu primeiro contacto com a Etiópia. Pelos campos que ladeiam a estrada muitas ovelhas, burros e vacas. A cidade começava-se a revelar bem maior e desenvolvida do que eu imaginava. Muitos edifícios em construção, sem recurso a máquinas ou gruas, muitas urbanizações com apartamentos de vários andares já habitadas, grandes escolas e universidades.
Castelo de Gondar
Depois de descansar um pouco no hotel e comer qualquer coisa num tasco duma rua movimentada, iniciei a minha visita ao que me levou a Gondar: o castelo de Fasiladas.
Gondar fica numa região montanhosa. Aliás, quase toda a Etiópia é montanhosa. O castelo ocupa naturalmente a zona mais elevada da cidade.
A entrada custa 200Birr. Quem quiser pode ainda ser acompanhado por um dos muitos guias que ali à entrada oferecem os seus serviços, primeiro por 200Birr, depois por 150, para uma hora e meia. Decido explorar sozinho.
A imponência do local e a escassez de turista aliados ao clima, fazem-me lembrar o Grande Zimbábue e a ilha de Moçambique. Estou num dos tesouros históricos de África, neste dia colorido por um grupo de etíopes, quiçá de Addis Abeba, que vêm vestidos com roupas tradicionais.
Dou duas ou três voltas ao recinto onde o enorme castelo clama por obras de restauro. No topo norte encontro alguns trabalhadores a recuperarem uma ala e, deparo-me pela primeira vez com as famílias de trabalhadores da construção. Iria encontrar estas situações noutros locais nesta cidade e no resto do país. Nas obras de construção da Etiópia vive-se o verdadeiro espírito da igualdade (pelo menos aparente): homens e mulheres trabalham lado a lado, a carregar baldes de massa e a assentar pedra. Por vezes os próprios filhos vivem no estaleiro.
Igreja de Debre Birhan Selassie
Numa colina a cerca de um quilómetro e meio do castelo ergue-se uma das mais exuberantes igrejas da Etiópia. Não se deixe o visitante desanimar pela tosca aparência exterior de pedra sobre pedra e telhado de palha, já que a sua riqueza está na face interior das paredes.
Pedindo algumas indicações pelo caminho lá acabei por chegar à igreja. Do outro lado da rua compro o bilhete por 100Birr, um valor super inflacionado nos últimos anos.
À entrada do recinto um clérigo, coberto com a sua túnica branca, aproxima-se de mim e num inglês muito diminuto convida-me a descalçar enquanto vai à volta abrir a porta.
Debre Birhan significa “montanha de luz”, em alusão a um milagre que terá ocorrido num outro local da Etiópia. Selassie significa “Santíssima Trindade”, representada na icnografia copta por três homens velhos e barbudos. A Trindade é aliás um dos motivos de decoração principal nos frescos da igrejas etíopes, a par com a figura de São Jorge a matar o dragão.
Desta forma, todo o interior da igreja do século XVII está decorado com frescos em cores vivas que representam cenas bíblicas, observadas no seu tecto por um exército de anjos.
Conta a lenda que esta igreja só se salvou da destruição por Dervishes sudaneses no final do século XIX porque, quando estes se preparavam para lhe lançar o fogo, foram atacados por um enorme enxame de abelhas que sai da igreja. Não fossem as abelhas e este teria tido a mesma sorte das outras igrejas por onde eles passaram.
Piscina de Fasiladas
Já quase no limite da exaustão, decidi já a meio da tarde ir até à piscina de Fasiladas. Pelo mapa que tinha não parecia assim tão longe e estava determinado a ir a pé. Pior que vencer o cansaço, foi dar com o local.
Placas com indicações são coisa inexistente na Etiópia e, os poucos que falam inglês ou não percebem o que procuro ou não sabem dar grandes indicações.
Mesmo depois de chegar ao local andei uns bons minutos às voltas à procura da entrada: não há mesmo nenhuma indicação e, só deduzi que estava no local certo por haver um terreno com enormes árvores rodeado por um velho muro.
Entro por um edifício onde alguns homens trabalham em teares fazendo os véus tradicionais a partir da algodão que fiam ali mesmo. Dirijo-me ao tanque central e só depois aparece o guarda.
O bilhete do castelo de Gondar é válido para visitar também este local. O mais incrível são desde logo as enormes raízes de árvores que envolvem os muros de pedra fazendo lembrar as imagens dos templos de Angkor Wat.
O complexo das piscinas é o palco da cerimónia religiosa do Timkat, na qual se celebra a epifania de Jesus no momento do seu baptismo. Nesse dia, o sacerdote faz a benção das águas e a multidão salta de seguida para o banho sagrado.
O guarda do espaço, que até era um tipo simpático vendeu-me por 10Birr este postal com uma fotografia da cerimónia.
Comer e dormir em Gondar
Como já referi no início desta página, à chegada ao aeroporto apanhei transporte com um homem que estava com uma carrinha a angariar clientes para o hotel L-Shape. Isto é pratica comum na Etiópia. Em todos os aeroportos estão agentes dos hotéis que nos levam gratuitamente até lá.
O L-Shape foi assim a minha primeira experiência com a hotelaria etíope. O valor que paguei pelo quarto, 230Birr (cerca de 9,5€) pareceu-me minimamente justo. Fiquei num quarto com casa de banho privada, água quente, tv, wi-fi e, uma vista espectacular!
A verdade é que o wi-fi nem sempre funcionou nas melhores condições e, depois de voltar do jantar falhou mesmo de vez, assim como a electricidade, que em parte falhou naquele piso. Fui por isso mudado para um quarto no piso abaixo, já sem a tal varanda com uma vista, mas como já era só para dormir, não foi grande stress.
Há vários restaurantes pela cidade de Gondar. Eu acabei por comer lá só uma refeição e, como já estava cansado, fiquei pelo restaurante do hotel. Durante a tarde comi alguns doces e bebi batidos de frutas, muito saborosos.
À noite, embora eles servissem pizzas, quis experimentar algo da cozinha etíope. Como é hábito meu, depois de uma sopa, escolhi algo ao calhas, com o nome mais estranho possível, neste caso, kifto. Mal sabia no que me estava a meter. Kifto é uma espécie de carne picada, mal cozida (ou por vezes, crua), super picante, servida, neste caso, com injera. Injera é a base da alimentação etíope, aqui servida em rolos e não estendida no prato como na maioria dos casos.
Valeu-me a sopa e a cerveja.
Fotografias de Gondar
Neste meu álbum do Flickr tenho mais de 100 fotografias que tirei em Gondar
Mapa de Gondar
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