Turismo Industrial em Leiria e Marinha Grande
Fora do roteiro da generalidade dos turistas são as indústrias que vão marcando ao longo dos séculos a identidade das populações, redefinindo o urbanismo, as paisagens e o nosso modo de vida.
É o caso dos concelhos de Leiria e da Marinha Grande, que a partir do século XVIII viram o seu desenvolvimento assentar sobre a indústria vidreira, de cimentos e mais tarde dos moldes e dos plásticos.
A história destas indústrias é contada nos museus locais (como é o caso do Museu do Vidro na Marinha Grande ou da exposição temporária “Plasticidade – Uma História dos Plásticos em Portugal” que esteve patente no Museu de Leiria).
Mas melhor que museus é poder ver in loco estas actividades. Isso é possível em algumas das indústrias e foi o que fiz recentemente a convite do Turismo Centro de Portugal. Assim, neste artigo vais poder conhecer alguns dos locais e como fazer para os visitar.
Fábrica Maceira-Liz – Museu do Cimento
O roteiro deste dia de Turismo Industrial começa na Maceira-Liz. Incontornável marco na história da indústria em Portugal, foi aqui que em 1923 se iniciou a produção de cimento Portland no nosso país, fruto do sonho de Henrique de Sommer e do Engenheiro Rocha e Mello. A escolha do local prendeu-se sobretudo com a jazida de matéria prima aí existente e a proximidade à linha férrea. A instalação de fornos cada vez mais eficientes levou à expansão da fábrica ao longo das décadas.
Em redor desta, para além das pedreiras de onde são extraídas as margas e calcários, matérias primas essenciais para o fabrico do cimento, destaca-se toda e estrutura sócio-cultural construída para os trabalhadores.
Escola, capela, piscina, campos desportivos, lojas, farmácia, centro de saúde foram algumas das infraestruturas contruídas nesta “cidade operária”, muitas delas ainda hoje em funcionamento.
A preocupação em documentar toda a história da fábrica vem dos seus fundadores. A título de exemplo, antes do arranque dos trabalhos contrataram um fotógrafo do Porto para retratar como eram os terrenos que em poucos anos ficariam irreconhecíveis. Tudo isto veio a dar origem ao museu que hoje podemos visitar, apelidado de “Museu do Cimento”, mas que tem muito mais para contar que a parte técnica deste produto.
Guiados por antigos trabalhadores somos levados a descobrir a história da comunidade que fez crescer a empresa e toda a infraestrutura construída em seu redor.
Não obstante, a visita inclui passagem por importantes equipamentos, hoje descativados, como é o caso da central de compressores, da sala dos turbo-geradores que produziu electricidade entre 1928 e 1972 ou, da locomotiva a vapor que fazia a ligação entre a fábrica e a linha do Oeste na Martingança.
Visitar a fábrica de cimento da Maceira-Liz
As visitas ao Museu do Cimento são gratuitas e guiadas por antigos trabalhadores. O horário deve ser validado junto da empresa pelos contactos que se encontram no site. O museu fica mesmo dentro da fábrica e a entrada faz-se pela porta lateral.
– Saiba mais aqui: Museu do Cimentos da Maceira Liz
Museu do Vidro da Marinha Grande
Fundado em 1998 o Museu do Vidro é o ponto de partida para descobrir a história da indústria que revolucionou a Marinha Grande.
Localizado no centro da cidade ocupa um palacete do século XVIII construído para residência dos irmãos Stephens, grandes impulsionadores da indústria do vidro.
A exposição estende-se ao longo de três pisos, onde podemos apreciar os mais variados objectos de vidro. Logo à entrada podemos observar um copo recordista com 160 litros de capacidade, sendo o primeiro piso ocupado por exposições temporárias.
Ao subir a escadaria somos recebidos por um monumental lustre de vidro lapidado da autoria de Floriano da Silva, igual (mas mais pequeno) a outro que se encontra na Casa Branca. A história do vidro continua aqui com os vidros lapidados, os cálices de bicos elaborados para a visita de Isabel II ou os frascos de vidro técnico.
Ao subirmos às águas furtadas destacam-se desde logo as paredes em gaiola pombalina, que nos relembram a época de construção e o grande apoio do Marquês de Pombal a Guilherme Stephens. Neste piso são apresentadas a história e as ferramentas desta indústria, assim como aplicações menos usais do vidro, como é o caso dos olhos de vidro.
Vidro artesanal
Mas a grande surpresa deste museu está do outro lado do jardim. Assim que saímos, um cartaz convida-nos ver “Artesanato ao Vivo”. Lapidação e maçarico são as artes com que José Medeiros e Mário Macatrão, respectivamente, trabalham o vidro num pequeno atelier às portas do museu. Mais do que dois artistas encontramos aqui dois contadores de histórias.
José Medeiros usa a rotação das pedras para lapidar o vidro. Um dos objectos mais requisitado é o frasco do vidreiro. Hoje tido como um símbolo do operário vidreiro, estes frascos eram elaborados pelos trabalhadores nas suas paragens para o lanche. De tamanho irregular e achatado dos lados para não rebolar tinha um gargalo apertado para matar a sede, sem beber muita água. Assim se aguentava a dura jornada de trabalho no sufocante calor à boca dos fornos.
O sotaque tropical de Mário Macatrão não o deixa esconder os 42 anos que viveu no Brasil. Desconfia ser o mais velho maçariqueiro do Mundo em actividade. É com o à-vontade de quem toda a vida mexeu no vidro, que vai partilhando as suas histórias enquanto molda mais uma pequena figura. Recorda com saudade os 15 bisnetos que deixou no Brasil ou o dia em que jogou contra os cinco violinos. Sobre a sua bancada exibe com orgulho um certificado de formação que valida os seu conhecimentos. Como se fosse preciso!
Vidrexport – produção de vidro ao vivo
Hoje em dia o fabrico do vidro é quase todo mecanizado. São já poucos os que sabem pegar na cana e soprá-lo. Os pulmões foram substituídos por compressores, os moldes de madeira arrefecidos a água substituídos por moldes metálicos arrefecidos por azoto.
Quem ainda trabalha o vidro de forma manual (ou semi-manual) fá-lo na produção de pequenas séries ou em trabalhos artísticos. Na Marinha Grande é possível ainda encontrar esta forma de trabalhar na empresa Vidrexport.
É claro que não deixa de ser fascinante apreciar a cadência das máquinas que em poucos segundos transformam um pedaço de matéria incandescente num recipiente translucido. Mas sem dúvida que o que mais fascina nesta visita é o trabalho manual: as bochechas que comprimem o ar, as mãos que rodam a cana, os olhares atentos à mais pequena imperfeição.
Visitar as indústrias da Marinha Grande
São várias as indústrias que se podem visitar na Marinha Grande, não só da área do vidro como também dos moldes e dos plásticos. Por norma as visitas têm de ser marcadas com bastante antecedência e estão dependentes da disponibilidade da empresa. No site do Turismo do Município da Marinha Grande há informações acerca das empresas que oferecem esta oportunidade.
– Veja mais aqui: Turismo Industrial na Marinha Grande
Moinho do Papel – Leiria
Voltando à cidade de Leiria, não posso deixar de incluir neste roteiro o Moinho do Papel. Localizado nas margens do rio Lis este espaço museológico engloba os edifícios onde em 1411 terá sido criada a primeira fábrica de papel em Portugal. Aqui é possível ficar a conhecer os processos ancestrais desta indústria, assim como da moagem de cereais que também aqui se fez durante séculos recorrendo à força das águas.
Mais Turismo Industrial
Se o Turismo Industrial lhe interessa, deixo mais algumas sugestões de locais a visitar na zona centro de Portugal:
- Museu Natural da Electricidade (Seia, Serra da Estrela)
- Museu Nacional Ferroviário (Entroncamento)
- Central Eléctrica da Levada de Tomar
- Central Termoelétrica de Porto de Mós (em restauro)
- Museu e Fábrica Vista Alegre (Ílhavo)
- MIAT – Museu Industrial e Artesanal do Têxtil (Mira de Aire)
- Fábrica da História (brevemente em Estarreja)
Podes ler aqui mais sobre Turismo Industrial – Turismo Centro Portugal
Esta viagem foi efectuada a convite do Turismo Centro de Portugal.
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